6 de novembro de 2015

Daniel Matador - 80 anos sem Lara

"Lá em Uruguaiana tem um goleiro que, quando ele joga, o seu team não perde."
Máximo Laviaguerre, então centroavante do Grêmio, comentando sobre Lara para a direção do clube após vê-lo jogar.


Caros

Poucos jogadores de futebol têm a oportunidade, aliada ao talento e persistência, de figurar no rol daqueles que entram para a história dos clubes. Ainda mais raros são aqueles que entram para o panteão e tornam-se lendas. Esse é o caso de Eurico Lara, o craque imortal, um dos maiores jogadores da história do Grêmio.

Lara, o Craque Imortal.


Lara nasceu em Uruguaiana, em janeiro de 1897. Seguia a carreira militar e era tenente do Exército Brasileiro. Em 1920, o centroavante gremista Máximo Laviaguerre havia visto Lara atuar pelo time do Exército e, impressionado com sua performance, sugeriu à direção tricolor que fizesse esforços para contratá-lo. "Lá em Uruguaiana tem um goleiro que, quando ele joga, o seu team não perde." A direção enviou então o volante Luiz Assumpção para conferir se tudo o que se dizia do arqueiro era verdade. E era. Luiz fez-lhe o convite para atuar na capital gaúcha, mas Lara não queria sair de Uruguaiana, rechaçando a investida. Mas o Grêmio, por conta da influência de seus dirigentes da época, fez com que o Exército determinasse uma providencial transferência de Lara para Porto Alegre. E aí não teve mais desculpas. Ele apresentava-se na mítica Baixada para iniciar sua história lendária.

Logo em sua primeira temporada atuando pelo clube já levantou uma taça, tendo sagrado-se campeão do Torneio Citadino de 1920. No ano seguinte tornava-se campeão gaúcho, erguendo a taça outras quatro vezes. Ao todo, nos 16 anos em que atuou como goleiro do Grêmio, conquistou 16 títulos. Também chegou a vestir a camisa da seleção gaúcha em 1922, tendo sido inclusive ovacionado pela torcida adversária em pleno Pacaembu, em um jogo contra a seleção paulista. Nesta partida, diz-se que Lara defendeu 20 chutes de Arthur Friedenreich, considerado na época o maior jogador em atividade no Brasil. Recebeu vários convites de clubes de lá, porém não queria deixar o Rio Grande do Sul.

Lara tornava-se, então, um dos principais nomes do esporte e sua fama atravessava fronteiras. Foi um dos primeiros ídolos gaúchos de um esporte que tornava-se cada vez mais popular no país. Em uma época em que os goleiros não tinham tanto destaque, fazia defesas acrobáticas e impressionantes. Muitos compareciam aos jogos da Baixada somente para vê-lo jogar. Contudo, Lara sofria de insuficiência cardíaca. Para piorar, também foi detectado como portador de uma tuberculose crônica, o que agravava mais seu quadro de saúde. E contribuía para dar ares ainda mais heroicos às suas atuações.

A história de Lara mistura fatos e contos, o que ajudou a criar o mito em torno de seu nome. Talvez a mais conhecida delas seja justamente a que deu ares de lenda à sua passagem pelo Grêmio. O ano era 1935, o Rio Grande do Sul comemorava o centenário da Revolução Farroupilha e o tricolor disputaria aquele que ficaria conhecido como "Grenal Farroupilha", o qual decidiria o título citadino daquele ano. O adversário tinha a vantagem do empate e os médicos vetaram a participação de Lara. Mesmo naquelas condições, ele afirmou: "Vou jogar a final!"

Foi então que a torcida viu uma das maiores atuações de todos os tempos. Lara defendeu simplesmente tudo! Reza a lenda que chegou a defender um pênalti, com a bola explodindo em seu peito e agravando o quadro de tuberculose, tendo de ser substituído por conta disso e morrendo em seguida. Na realidade, a substituição realmente ocorreu. Lara só aguentou jogar o primeiro tempo, tendo de deixar a equipe no intervalo, angustiado pelo fato de que o jogo estava empatado e o título iria para o rival. Mas, no segundo tempo, Oswaldo Rolla (o também lendário Foguinho) abriu o placar para o tricolor. Mal ocorre a saída de bola e Lacy amplia o placar para o time gremista. O Grêmio vence o jogo por 2 a 0 e sagra-se Campeão Farroupilha, naquele que tornaria-se o maior clássico até então. Foi uma conquista tão importante que os dirigentes gremistas firmaram o compromisso de comemorar sua conquista todos os anos, durante 100 anos, o que ocorre até hoje.

Bola do Grenal Farroupilha, último jogo de Lara pelo Grêmio, pertencente ao acervo do clube.

Lara chegou a participar das comemorações do título junto com seus colegas de equipe e dirigentes. Mas, logo em seguida, teve de ser levado ao Hospital Beneficência Portuguesa, onde permaneceu por cerca de dois meses, vindo a falecer em 6 de novembro de 1935. Seu enterro reuniu mais de 30 mil pessoas, o que só atestou sua condição de ídolo. Até hoje é o único jogador dos grandes clubes brasileiros a ter seu nome na letra do hino oficial. Lupicínio Rodrigues imortalizou em versos a lenda do goleiro que, quando jogava, seu time nunca perdia.

A data de hoje marca 80 anos do dia em que Lara deixou a condição de homem para virar mito.

"Lara, o Craque Imortal,
Soube teu nome elevar.
Hoje, com o mesmo ideal,
Nós saberemos te honrar."

Saudações Imortais